No capítulo V do "Sermão de Santo António", veremos as quatro espécies que são criticadas pelos seus vicíos, pelas suas características e pelos seus defeitos paralelos ao Homem. Veremos também as técnicas utilizadas pelo Padre António Vieira.
Os peixes presentes neste capítulo são: - Roncadores; - Pegadores; - Voadores; - Polvo.
Roncadores
No capítulo V, o Padre começa por dizer que os Roncadores são peixes pequenos que querem ser grandes, por isso roncam, para se parecerem algo que não são. Isto é comparado com a arrogância, a soberba e a presunção dos Homens. "[...] Roncadores, e vendo o seu tamanho, tanto me moveram a riso, como a ira. É possível que sendo vós uns peixinhos tão pequenos haveis de ser as roncas do mar?" (linhas 2, 3 e 4).Também são comparados com os espadartes, visto que estes são grandes e não precisam de roncar para o serem. "Dizei-me, o Espadarte porque não ronca?" (linhas 5 e 6).
Este pequeno peixe tem o nome de roncador por causa do barulho ruidoso que produz quando esfrega os dentes, a sua bexiga natatória amplifica esse som tornando-o mais alto.
Roncadores:
São comparados com histórias conhecidas como a de Pedro que jurou nunca negar Jesus Cristo mas acabou por o fazer. E com a história de Golias, que apesar de ser um gigante, perdeu contra David, um homem muito mais pequeno.
Como argumento de autoriedade, é dito que "[...] Deus não quer Roncadores, [...]" (linha 7) e q devemos "[...] abater, e humilhar aos que muito roncam." (linha 8), estes sendo os Homens que se vanglorizam. O Padre aconselha os verdadeiros Roncadores a calarem-se e imitarem Santo António. "[...] o verdadeiro conselho é calar, e imitar a Santo António." (linha31).
Recursos expressivos:
Interrogação retórica - "É possívelque sendo vós uns peixinhos tão pequenos haveis de ser as roncas do mar?" (linhas 3 e 4); Vocativo - "São Pedro, [...]" (linha 8); Uso do latim - "[…] Sic non potuisti una hora vigilare mecum?" (linha 17); Enumeração - "[…] o saber e o poder." (linha 32).
Pegadores
Esses peixes destacam-se pelo seu comportamento parasitário, fixando-se a peixes maiores. Neste capítulo estes peixes pequenos representam o parasitismo e o oportunismo, pois aproveitam-se de peixes maior para sobreviverem. "Pegadores se chamam estes, de que agora falo, e com grande propriedade, porque sendo pequenos, não só se chegam a outros maiores, mas de tal sorte se lhes pegam aos costados que jamais os desaferram." (linhas 39, 40 e 41).
Pegadores:
Os pegadores aprenderam com os navegadores portugueses a serem oportunistas. Isto deve-se porque um governador anda sempre rodeado de adoradores que para benefício próprio aproveitam-se do mesmo. "Este modo de vida, astuto que generoso, se acaso se passou, e pegou de um elemento a outro, sem dúvida que o aprenderam os peixes do alto depois que os nossos Portugueses o navegaram;" (linhas 45, 46 e 47); "porque não parte Vizo-Rei ou Governador para as Conquistas que não vá rodeado de Pegadores, [...]." (linhas 47 e 48). António Vieira dá enumeros exemplos bíblicos de pegadores, como o de quem queria matar o Menino. "[...]« eram mortos todos aqueles que queriam tirar a vida do Menino» [...]. Os que queriam tirar a vida a Cristo Menino eram Herodes, e todos os seus, toda a sua família, todos os seus aderentes, todos os que seguiam, e pendiam da sua fortuna. Pois é possível que todos estes morressem juntamente com Herodes? Sim: porque em morrendo o Tubarão, morrem também com ele os Pegadores[...]." (linhas 59, 60, 61, 62 e 63).
Recursos expressivos: Uso do latim - "Defuncti sunt enim qui quœrebant animam Pueri" (linha 60); Interrogação retórica - "Pode haver maior ignorância, que morrer pela fome, e boca alheia?" (linhas 86 e 87); Exclamação - "[...] grande desgraça!" " (linha 91).
Voadores
O orador critica os Peixes Voadores, devido ao seu desejo de voar enquanto Deus os criou como animais do mar. "Dizei-me, voadores, não vos fes Deus para peixes? Pois porque vos meteis a ser aves? O mar fê-lo Deus para vós, e o ar para elas." (linhas 94, 95 e 96).
As nadadeiras peitorais destes peixes permitem-lhes dar pequenos voos rentes à superfície da água, para fugir dos seus predadores.
Voadores:
Assim são criticados pela sua ambição, vaidade, capricho e presunção, defeitos e vícios também presentes no Homem. "[...] nem anzol, mata-vos a vossa presunção, e o vosso crapicho. [...]; ao Voador mata-o a vaidade de voar, [...]. Grande ambição é que sendo o mar tão imenso lhe não basta a um peixe tão pequeno todo o mar, [...]." (linhas 102,103, 105, 106 e 107). Estes peixes são aconselhados pelo Padre, a não cobiçar o bem do outro "Contentai-vos com o mar, e com nadar, e não queiras voar, pois sois peixes." (linha 96). E compara-os a Ícaro, que voou demasiado perto do Sol, derretendo as suas asas. "Se o mar tomara exemplo nos rios, depois de Ícaro se afogou no Danúbio, não haveria tantos Ícaros no Oceano." (linhas 132 e 133).
Recursos expressivos:
Vocativo - "Dizei-me, Voadores, não vos fes Deus para peixes?" (linha94); Interrogação retórica - "Dizei-me, Voadores, não vos fes Deus para peixes?" (linha94); Alegoria - "Aos outros peixes mata-os a fome, e engana-os a isca; ao Voador mata-o a vaidade de voar; e a sua isca é o vento." (linhas 104 e 105);
Polvo
O polvo como meios de defesa, possui autonomia nos oito braços, capacidade de largar tinta e de mudar a sua cor. Tem formato de estrela, sem espinha e o capuz faz parecer um monge. Este molusco, é a personificação da mansidão e da brandura. Dito traidor e hipócrita. "[...] parece a mesma brandura, a mesma mansidão. E debaixo desta aparência tão modesta, ou desta hipocrisia tão santa, [...]. Consiste esta traição do Polvo primeiramente em se vestir, ou pintar das mesmas cores de todas aquelas cores, a que está pegado." (linhas 153, 154, 156 e 157). É criticado em paralelo com o Ser Humano pelo seu engano, sua dissimulação e sua hipocrisia.
Polvo:
Como argumento de autoriedade, Padre António Vieira diz que este animal é o maior traidor do mar de acordo com 2 grandes Doutores "[...] os dois grandes Doutores da Igreja Latina, e Grega, que o dito Polvo é o maior traidor do mar." (linhas155 e 156). Contrasta-se com um camaleão devido ao oposto das suas capacidades de se camuflar e com Proteu devido ao uso do seu aspeto. "As cores, que no Camaleão são gala, no polvo são malícia; as figuras, que em Proteu são fábula, no Polvo são verdade, e artifíco." (linhas 157 e 158). Entre diversos exemplos bíblicos, o Polvo é comparado com Judas, devido à sua mentira e capacidade de traição. "Vê, Peixe aleivoso, e vil, qual é a tua maldade, pois Judas em tua comparação já é menos traidor." (linhas 167 e 168).
Recursos expressivos: Paralelismo e ironia - "[...] com aquele seu capelo na cabeça, parece um Monge, com aqueles seus raios estendidos, parece uma Estrela, com aquele não ter osso, nem espinha, parece a mesma brandura, a mesma mansidão." (linhas 151, 152 e 153); Comparação - "O polvo, com aquele seu capelo na cabeça, parece um Monge" (linhas 151 e 152).
Padre António Vieira utiliza diversas expressões e formas diferentes de fala para captar a atenção da sua audiência e acaba o capítulo reforçando a ideia de como os peixes se assimilam muito aos humanos e
lamenta apenas o mar ouvir a sua doutrina.
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